sábado, 3 de abril de 2010

Ambientalistas contabilizam prejuízos na "era Maggi"

Andréia Fanzeres
Revista O Eco







Andréia Fanzeres
Represamento de rio em Sapezal
Só quando sete de dez empreendimentos hidrelétricos que transformarão 110 quilômetros do Rio Juruena numa seqüência de lagos já têm licença de instalação e grupos indígenas afetados pelo complexo negociam compensações financeiras milionárias a Fundação Nacional do Índio (Funai) resolveu acordar
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Depois de sete anos e três meses no governo de Mato Grosso, Blairo Maggi deixou nesta quarta-feira o cargo para disputar uma vaga no Senado nas eleições de outubro. A partir da eclosão de sucessivos escândalos ambientais sob a gestão de um dos maiores produtores de soja do mundo, Maggi fez de quase tudo para para sair do governo pintado de verniz verde e tentar mudar a imagem de destruidor das florestas, que lhe rendeu prêmios como o “Motosserra de Ouro”. Para isso, firmou pactos como a moratória da soja, da carne, se comprometeu com a recuperação de áreas de preservação permanente, aprendeu a usar e abusar da palavra sustentabilidade em seus discursos e acabou vendo os índices relativos de desmatamento na Amazônia no estado caírem, em vez de subirem. Os jornais mato-grossenses ressaltaram a história do governador, jovem empresário do agronegócio, que, como boa parte da população do estado, veio do Paraná para transformar o Cerrado e a Amazônia em lavouras de monocultura de grãos, seguindo o império já construído por seu pai, André Maggi. Foi aclamado do início ao fim dos seus dois mandatos pelos eleitores locais como alguém que promoveu a economia mato-grossense e se esforçou para melhorar a infraestrutura no estado – nos últimos meses entregou maquinário pesado a todos os municípios e inaugurou obras de asfaltamento nas principais cidades.
Mas Maggi jamais conseguiu a mesma empatia em âmbito nacional graças às denúncias sobre a conduta de seu governo na área ambiental . Bastava acompanhar os números do desmatamento e de focos de calor, mês a mês.
O desinteresse para zelar pelo meio ambiente no estado foi escancarado após a Operação Curupira, que deflagrou em junho de 2005 esquemas complexos e arraigados de fraude no controle madeireiro apoiados por servidores do Ibama, foco inicial da atuação intervencionista do governo federal. Mas a sujeirada revelada era tão generalizada que foram presos, além de gente do Ibama, despachantes e madeireiros e servidores da Fundação Estadual de Meio Ambiente (Fema), inclusive seu presidente, Moacir Pires. A entidade acabou extinta e em seu lugar foi criada a atual Secretaria do Estado de Meio Ambiente (Sema). Um mês depois da operação Curupira, o desmatamento em Mato Grosso caiu 95%. 
Naquele ano, uma pesquisa do IBOPE mostrou que os mato-grossenses eram contra a destruição da floresta e achavam que os cuidados com recursos naturais deviam aumentar, mesmo que isso prejudicasse a economia inicialmente e provocasse desemprego. Mas a população não ligava o desempenho ambiental do estado com seu governador. Metade dos entrevistados votou no empresário Blairo Maggi em 2002 e 68% aprovavam a sua administração.
Após o escândalo da Curupira, o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) verificou que entre 2005 e 2006 apenas 1% das multas dadas na mega operação foram pagas. Na Sema, até 2008, 83% das multas aguardavam análise jurídica, 9% apresentavam processos inconclusos, 3% foram canceladas, apenas 1% tinha sido paga e 4% resultaram na condenação do infrator. Em 94% das multas por grandes desmatamentos, os autuados alegaram que não eram proprietários das áreas em questão, e por isso, não poderiam ser responsabilizados.
A administração Maggi também foi marcada pela propagação de usinas hidrelétricas ao longo dos principais rios formadores da bacia amazônica. Além de empreendimentos do porte da usina de Dardanelos, hoje em fase final de construção em Aripuanã, que afetou o regime de águas nas quedas Andorinhas e Dardanelos, assistiu-se no estado a uma profusão de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs). Com a intenção de dispensar a necessidade de estudos ambientais aprofundados, essas usinas de até 30 MW de potência vêm sendo aprovadas pelo governo estadual, cujos empreendedores são empresas como a própria Maggi Energia S/A.
Por causa de estudos fajutos, impactos ambientais gravíssimos a terras indígenas e manobras para compensar financeiramente diversas etnias que inicialmente se posicionaram contra essas usinas, muitas delas foram, nos anos Maggi, alvo de ações judiciais. A maioria, no final das contas, não têm conseguido barrar os empreendimentos. Os rios Teles Pires, Juruena  e Xingu são os mais ameaçados por hidrelétricas no estado. Essas intervenções numerosas nos rios mato-grossenses fizeram ictiólogos compararem o que acontece nas terras de Maggi hoje ao represamento em cadeia dos rios paulistas, entre 1950 e 1960.
Maggi começou, então, a tentar se mexer para mostrar que sua vilania ambiental não era aquilo tudo. E os índices de desmatamento começaram a cair. Em 2006, o estado assumiu a gestão florestal e inaugurou sistemas de cadastro e controle da movimentação madeireira. Entretanto, as medidas não evitaram novos escândalos no setor como os revelados pela Operação Guilhotina, em 2007, desencadeados pelo próprio estado. E também por outras operações organizadas pelo Ibama que demonstraram que o compromisso de Maggi em coibir os crimes ambientais não eram ainda tão profundos, como visto na Operação Mapinguari.

Caminhão da Marfrig carregado atravessa Terra Indígena Utiariti.
Mato Grosso comemorou o interesse dos produtores de soja em recuperar o passivo ambiental de suas áreas, que somam mais de cinco milhões de hectares. Na época, Blairo Maggi garantiu que em 2010 não haveria mais “um pé de soja plantado em área de preservação permanente (APP) no Estado. Técnicos da secretaria de meio ambiente atestam que o compromisso não está nem perto de ser cumprido.

Em 2007, em evento pomposo com organizações não governamentais e associação de sojicultores, Maggi intermediou um ‘pacto ambiental’ em que os produtores de soja se comprometiam a recuperar, até 2010, as áreas de preservação permanente destruídas em suas propriedades, o que somava mais de cinco milhões de hectares. Naquela época, Maggi disse que em 2010 não haveria mais “um pé de soja plantado em área de preservação permanente (APP)” no estado. Passados três anos da promessa, técnicos da secretaria de meio ambiente atestam que o compromisso não está nem perto de ser cumprido.  A imagem de Maggi passou a mudar mesmo a partir da divulgação das primeiras ações do programa Lucas Legal. Lucas do Rio Verde, município que sozinho ostentava a produção de 1% da soja nacional em 2008, aceitou a presença da organização The Nature Conservancy (TNC) para dar assistência técnica à regularização dos passivos ambientais em 100% das propriedades, chamando os proprietários a se adequarem à legislação ambiental sem a cobrança de multas por infrações ambientais anteriores ao seu compromisso.  Esta foi, a princípio, uma boa estratégia para mostrar que Mato Grosso estava se esforçando para recuperar o tempo perdido, sem que imediatamente tivesse que mostrar resultados concretos.
Não demorou muito para o programa Lucas Legal servir de base para o MT Legal, que logo recebeu as bênçãos de Carlos Minc, então ministro do meio ambiente. Em poucos meses, Minc transformaria o MT Legal em sustentação para o programa federal Mais Ambiente.
Quando no ano passado Maggi se empolgou e assumiu que seu governo apoiava a moratória da carne e estava de acordo com o compromisso de frigoríficos como a Marfrig, que não iria comprar carne de áreas de desmatamento ilegal, recebeu uma saraivada de críticas dos deputados estaduais e associações de classe. Ficava claro que os rompantes verdes do governador não tinham respaldo em muitas das ações do governo mato-grossense.
O recrudescimento das ações federais contra o desmatamento, como a imposição de restrições a crédito rural aos envolvidos com atividades ilegais e a execução de operações de fiscalização como a Arco de Fogo, irritaram ainda mais o governo Maggi e deputados. Uma sessão na Assembléia Legislativa em 2008, poucos dias após a saída de Marina Silva do governo Lula, revelou que para tentar manter a carapuça verde, Mato Grosso se valeu de tudo que podia, até de tentar desmoralizar os números oficiais do desmatamento aferidos pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). 

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