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quarta-feira, 21 de julho de 2010
Belo Monte é considerada economicamente inviável em análise de cenários de risco.
O anúncio feito na semana passada pela ANEEL sobre a composição da Sociedade de Propósito Específico (SPE) do consórcio que vai construir a polêmica hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu (PA), revela uma falta marcante de presença do setor privado. O consórcio Norte Energia(1) formado por 18 membros é marcado pela ausência de grupos importantes do setor financeiro e da indústria de construção de barragens no país. A participação do Governo Federal, direta ou indiretamente no consórcio (incluindo fundos de pensão de estatais) totaliza 77,5 por cento. A presença minoritária de investidores privados demonstra, entre outros fatores, preocupações com relação aos riscos financeiros da terceira maior hidrelétrica do mundo.
A falta de entusiasmo do setor privado reflete uma série de perguntas não respondidas: desde o custo estimado de construção do empreendimento (já muito maior do que originalmente projetado) até incertezas sobre a capacidade de geração de energia e custos de mitigação e compensação de grandes impactos sociais e ambientais.
A disposição do Governo Federal em oferecer enormes subsídios e utilizar fundos de pensão de empresas e bancos estatais num projeto de viabilidade econômica altamente duvidosa, tem provocado fortes críticas no país. "Os contribuintes e servidores públicos com investimentos em fundos de pensão não têm noção dos enormes riscos associados a Belo Monte. Os trabalhadores da Petrobrás, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil estão gastando o dinheiro de suas aposentadorias para financiar um projeto que investidores privados têm medo de tocar," afirmou Raul do Vale, do Instituto Socioambiental.
Um relatório intitulado "Incertezas no Desenvolvimento hidroelétrico da Amazônia: Cenários de Risco e Questões Ambientais em torno da Barragem de Belo Monte" divulgado em maio pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e pelo Fundo Estratégico de Conservação (CSF) aumentou os receios dos investidores. O estudo revelou uma probabilidade de apenas 28 por cento do empreendimento gerar uma taxa positiva de retorno ao longo dos primeiros 50 anos de seu funcionamento. Uma análise do cenário de risco calculou uma grande probabilidade de perda para investidores, que oscilaria entre US$3 e 8 bilhões.
Problemas de ineficiência na capacidade de geração de Belo Monte - que produziria em média apenas 39 por cento da capacidade instalada de 11.233 megawatts, em decorrência de flutuações sazonais no vazão do rio Xingu - indicam que é previsível a construção de outras grandes barragens. O relatório do ITA/CSF sobre o cenário de risco conclui que "a construção de Belo Monte deve levar a uma crise totalmente previsível - alguns diriam até planejada - que vai gerar uma enorme pressão para a construção de novas barragens reguladoras a montante de Belo Monte voltadas para a plena utilização de sua capacidade de geração." Há muito tempo, especialistas têm afirmado que Belo Monte é apenas a primeira de uma série de barragens planejadas para o rio Xingu, com implicações sociais, ambientais e econômicas imprevistas.
Em resposta às incertezas sobre a viabilidade econômica do projeto, o Governo Federal tem anunciado uma série de incentivos sem precedentes para atrair investidores, incluindo crédito subsidiado, isenção de impostos e garantias de seguros pelo setor público. O BNDES vai financiar até 80 por cento do orçamento para a construção de Belo Monte, estimado oficialmente em R$ 19 bilhões, mas que pode chegar a R$30 bilhões segundo analistas econômicos, com taxas anuais de juros de apenas 4% para o que seria o maior empréstimo na história do banco. O banco tem sido o alvo de reiteradas criticas sobre a falta de salvaguardas socioambientais adequadas e de critérios transparentes para a tomada de decisões na aprovação de empréstimos para mega-projetos.
Para Telma Monteiro, coordenadora de energia da ONG Kanindé, "o governo é majoritário, portanto é líder do consórcio com quase 80%. Ou seja, a obra é pública, mas as empreiteiras serão contratadas pelo consórcio sem licitação num inequívoco drible da lei de licitações públicas. Um ótimo negócio!"
"Belo Monte e outras mega-barragens previstas na Amazônia não são necessárias. Estudos demonstram que investimentos em programas de eficiência energética e incentivos às fontes alternativas têm um custo - beneficio melhor para a sociedade brasileira. Essas medidas evitariam a necessidade de novas mega-barragens na Amazônia, com uma economia de bilhões nesse processo" afirmou Brent Millikan, Diretor do Programa da Amazônia da International Rivers. "Esse projeto representa um enorme benefício direto para grandes empreiteiras, inclusive várias das maiores doadoras de campanhas eleitorais, à custa do contribuinte brasileiro, povos indígenas, ribeirinhos, pequenos agricultores e da biodiversidade única do rio Xingu".
O estudo: "Incertezas no Desenvolvimento hidroelétrico da Amazônia: Cenários de Risco e Questões Ambientais em torno da Barragem de Belo Monte" (em inglês)
Nota
(1) O consórcio Norte Energia é controlado pelo grupo Eletrobrás, com participação de 49,98% divididos da seguinte forma: Eletrobras (15%), Eletronorte (19,98%) e Chesf (15%). Os fundos de pensão de funcionários de bancos e empresas estatais (Petros, Funcef, Previ) têm participação de 25%. A participação majoritária do Governo, no total de 77,5% se contrasta com o papel coadjuvante de investidores do setor privado no consórcio, tais como o grande produtor regional de ferro Sinobras (1%) e empresa de energia Gaia Energia e Participações do Grupo Bertin (9%), líder da indústria de carnes na Amazônia Brasileira. Amazonia.org.br/International Rivers Network/EcoAgência
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